Subi no pé e bati boca com ele, me enfiei nas galhas e gritava: -corte, mas corte comigo sentada aqui... me derrube também!
Discutimos quase uma tarde inteira e eu trepada na árvore.
Minha Nena (uma espécie de babá/mãe/cozinheira), cansada de mandar eu descer da árvore, ligou para meus pais e eles chegarem logo logo para saberem do que se tratava.
Mandaram eu descer e parar de brigar com o sujeito, que mostrava um arzinho cínico, com um risinho odioso.
Eu desci com uma raiva tão grande, chorando tanto porque o cara ia cortar minha relíquia, que só disse para todos eles ouvirem: - um dia você vai querer manga e não vai ter, um dia você vai querer sombra e não vai ter.
Entrei, me tranquei no quarto, dessa vez com raiva dos meus pais, por me tirarem de cima da mangueira. Mas ficaram de conversê lá.
Depois soube que o cara desistiu de cortar.
No outro dia, voltando da escola, o famigerado vizinho tava me esperando passar na frente da casa dele, no portão. Quando o vi atravessei a rua e ele veio atrás de mim, me segurou pelo ombro e disse: -menina o mundo precisa de alguém que goste de árvores assim. Você tem sete pés de manga na sua casa e fez toda aquela confusão por causa de um apenas!?!?
Eu falei: - mas se você tira uma, ficam seis e se amanhã o outro vizinho também quiser arrancar outra? Ficam cinco.
Ele riu e disse: danada, vá pra casa! Mas me dê um cheiro. Vamos ficar de bem, não cortarei mais suas árvores, nem as de ninguém. Me desvencilhei do infame e corri pra casa. Só que dessa vez quem tinha um risinho no canto da boca era eu.
Eu não tinha interesses ecológicos, consciência ambiental, tinha interesse no meu quintal, na beleza daquele lugar, que além de mangas, tinha goiabas, carambolas, cajus, cocos, amoras, jambos do Pará, cerejas, pinhas, eu amava viver la em cima delas. Às vezes brincando com meu irmão, às vezes de papo com a minha amiga, fazendo tarefa ou apenas preenchendo minha memória do cheiro, cores e sabores daquele universo, que pra mim era pura magia. Aquilo lá era o melhor play. A infância atual jamais sentirá a sensação.
Hoje me deparo com essa cena de Salvador! Estão derrubando inclusive Baobás centenários, para dar lugar ao BRT, árvores que jamais serão recuperadas se arrancadas. Uma tristeza.
Tive vontade de vir aqui contar essa historinha só pra dizer que eu queria subir e brigar com o ACM Neto também.
Uma pena que eu só pude mudar a realidade do meu quintal!
Baianos subam nas suas árvores!!!!!
😰😰😰Simoninha Xavier
